Como é ser mãe? O que é viver uma maternidade real? Tenho compartilhado com vocês relatos de mulheres mães incríveis: o primeiro foi da Larissa e o da semana passada foi da Lorena. Hoje você fica com o relato da Juliana, mãe da Lia e da Celina.
“Minha maternidade e seus tempos
Os dois tracinhos tímidos ainda não me tornariam mãe, mas já me colocariam numa espécie de suspensão. Como que numa espera para o que viria. A minha primeira gestação foi dividida entre um medo imenso e muita expectativa.
Falaria de amor, mas se tratava muito mais de desejo por aquele bebê do que propriamente amor. Era o desejo do que eu ainda nem sabia. E que hoje, cinco anos depois, eu continuo inventando.
Porque, pra mim, é isso. Se na gravidez o trabalho era de adivinhar: o sexo, com quem se parece, quando vai nascer, será que vai ser saudável? Depois que a Lia nasceu meu trabalho foi de inventar. Precisamos juntas nos inventar mãe e filha. Juntas, mas também separadas.
E quando as coisas pareciam estar indo num ritmo bom, tudo mudava de novo. Que mãe era essa que eu queria ser? E que mãe eu conseguia ser? E para além de ser mãe? Que lugar existia pra mim no mundo?
Eu já era outra. À época eu não conseguia me imaginar deixando aquela bebê tão mamante com outra pessoa para voltar a trabalhar – eu trabalhava em Niterói e morava no Rio. Voltei só pro doutorado. Lia acordava a noite inteira. Eu precisei fazer dieta de restrição para continuar amamentando. Eu dormia pouco, me sentia absolutamente privada da vida. Suas sonecas duravam enquanto ela estivesse mamando.
Senti uma solidão imensa. Até entender que minha vida tinha realmente mudado. Era tudo diferente. Eu não vivia só pra mim. E isso é uma realidade avassaladora. É o maior amor do mundo, sim. Mas é também um atropelo. Nem sei se tem que ser assim, mas pra mim foi. E fui entendendo que se eu ficasse em casa, eu me perderia de mim.
Me lancei na vida e encontrei outras mulheres que eram antes só nomes do facebook. Começamos a ganhar a cidade de mãos dadas e slings amarrados. Estávamos juntas, sonhávamos juntas. E isso precisava se ampliar. Nasceu um projeto, finalmente!
Era sim do universo materno, mas era um sonho meu. Na véspera do lançamento do Imagina Mãe, descobri minha segunda gravidez – surpresa. Eu, finalmente estava trilhando um caminho, me reinventando mulher e essa notícia me remeteu a todas as privações. Mais uma vez, o desejo por ter mais um filho falou mais alto.
Eu já não morava no Rio, vinha de ônibus com a Lia para a aula do doutorado. Depois ela passou a ficar com o pai e eu pegava o ônibus. Aquelas horas eram de liberdade. Era muito menos cansativo pegar estrada, ter aula e voltar do que passar o dia inteiro cuidando da Lia.
Mas a segunda gravidez não foi tão leve. Tive limitações físicas. Meu tema de pesquisa deixou de fazer sentido pra mim, já há muito tempo. Foi duro, mas decidi trancar. E aí vivi integralmente ser mãe e estar grávida. Mais um luto por um caminho que já não era o meu.
E precisava de fôlego para uma gestação de sustos e uma filha de dois anos. Mais uma suspensão. Eu nunca me bastei ali – exclusivamente mãe. Mas também não reconhecia meu desejo em nenhum lugar já caminhado. Esse estado de coisas em que não se sabe muito bem o que vai acontecer foi angustiante. Também privilégio absurdo, porque pude ter esse tempo para me reinventar muitas vezes. Para ir e vir.
Celina chegou trazendo doçura e subvertendo o tempo. Celina me trouxe calma, Lia rebuliço. As duas chegaram me mostrando meus medos. Mas também resiliência, frustração e leveza. Me trouxeram, sobretudo, coragem para me lançar e recomeçar.
Foi porque pude escolher escolas incríveis para elas, que pude ressignificar a educação e me reconectar com esse desejo tão antigo. Porque eu vivi uma parceria com a equipe para cuidarmos juntos das meninas. E poder dividir e confiar naquelas pessoas me trouxe o fôlego para ir e traçar meu próprio caminho.
Cada uma tem seu espaço, podemos respirar para seguirmos lado a lado. Esse ano termino minha segunda graduação, certa de um caminho transformador pela educação. Porque foi por esse caminho que pude – finalmente – dividir todos os cuidados das meninas com o pai delas. Não porque ele não estivesse ali. Mas porque eu não deixava de estar presente nunca. E isso pesa. Muito. Hoje estamos juntos. Ele pode ser. E eu também.”
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